Rebranding Cracker Barrel
O rebranding da Cracker Barrel é um caso emblemático que ilustra um fenômeno que tem se mostrado crescente na indústria do design e do branding: a problemática busca por marcas minimalistas.
A Cracker Barrel é uma rede tradicional estadunidense de restaurantes, com mais de 50 anos de existência.
Recentemente, foi divulgado o rebranding de sua marca, que envolveu um investimento de mais de 700 milhões de dólares e um resultado amargo para todos os envolvidos, tamanho descontentamento do público que a empresa voltou atrás e substituiu a nova marca que havia sido apresentada ao público resgatando elementos que haviam sido deixados de lado.
Com a proposta de modernizar e atrair um público mais amplo para a rede de restaurantes, a visão para o redesign envolveu a criação de uma “marca minimalista”. Como resultado, foi apresentado ao mercado um novo logotipo mais “limpo” e sem um elemento que foi símbolo da marca por muitos anos, o icônico “Uncle Herschel”.
Na Motora não é incomum recebermos esse mesmo briefing de potenciais clientes: criar algo clean, moderno, minimalista. Esse pedido reflete uma onda do universo da moda e do design que perpassa símbolos e elementos culturais que tem sido associados ao luxo, a sofisticação e ao elegante. E é exatamente aqui que pode morar um problema.
1. Qualidade técnica não é minimalismo
Em meio a logos criadas por profissionais não especializados (ou até inteligências artificiais) é comum que a qualidade técnica se confunda com o tal minimalismo. Uma marca cheia de elementos ou criada a muitos anos pode não estar preparada para ser aplicada corretamente nos meios digitais. Para isso, é preciso considerar, principalmente, capacidade de redução da marca, grid, arejamento e até versões pensadas para os diferentes meios e necessidades.
O design minimalista, embora tenha sido fundamental para trazer clareza, funcionalidade e elegância às interfaces e marcas, não é condição necessária para que uma apresente os atributos de elegância, sofisticação e modernidade. Além disso, uma marca com boa performance nos meios digitais e físicos não precisa ser necessariamente minimalista. Às vezes o mais recomendado é o redesign de elementos clássicos e representativos da marca, sem perder a conexão com a história e o elemento original.
2. Tendências não posicionam
Posicionar uma marca envolve passar uma mensagem única. Só se posiciona quem tem coragem de ser autêntico e é impossível alcançar esse status copiando caminhos visuais de grandes players, ou pior, copiando um estilo na moda. O risco aqui envolve a criação de um universo visual desconectado da essência e história da marca ou a adoção de um conceito que acaba sem personalidade.
Uma das principais críticas é a sensação de padronização excessiva que o minimalismo gera quando adotado como regra absoluta. Muitas marcas, produtos e ambientes parecidos demais, perdendo identidade, expressão e vínculo emocional com o público. Isso dificulta a diferenciação em mercados saturados.
3. Só o público importa
O visual deve sempre ser etapa final da visão e estratégia do negócio e o sucesso de qualquer negócio envolve invariavelmente seu público-alvo. Por isso, qualquer mudança deve sempre considerar quem a empresa deseja atingir e se relacionar. É a correlação do público com a marca e as tendências de comportamento dessas pessoas que mais importam.
Ao priorizar a redução máxima de elementos visuais, muitas vezes o minimalismo resulta em escassez de detalhes ou falta de informação relevante. O design pode perder diversidade estética, tornando-se excessivamente frio, impessoal e, paradoxalmente, menos funcional, especialmente em contextos que precisam de riqueza visual ou clareza na comunicação.
4. Apresentar a mudança é chave
Se, partindo de cada tópico indicado anteriormente, a decisão da empresa for realmente pela mudança da marca e adoção do minimalismo, ainda há um elemento que pode fazer o processo ser um sucessso ou um completo fracasso: a forma como ela apresenta essa mudança ao mercado.
Mais do que mudar, é chave comunicar a mudança.
Está tudo bem mudar de público; está tudo bem eliminar elementos que não se comunicam mais com a visão do negócio; está tudo bem eliminar eventuais elementos de marca que dificultam a aplicação em novos pontos de contato alvo da empresa…
Mas não está tudo bem divulgar a mudança de forma abrupta, não respeitando a história e relação construída com o mercado ao longo dos anos de atuação da empresa.
Por isso, é preciso envolver o público, gerar conexão, contar uma história e abrir diálogo.
5. Cracker Barrel
No contexto da Cracker Barrel, uma marca profundamente ligada à tradição, à nostalgia e a uma experiência cultural específica, a adoção abrupta de um logo simplificado sem o icônico “Uncle Herschel” geraram revolta imediata. Esse episódio demonstrou que, durante o rebranding, a empresa provavelmente pecou em algum dos itens indicados:
Focou demais em uma tendência de design pouco aplicada no contexto do negócio
Não considerou os possíveis signos simbólicos ou o capital emocional existente com a marca antiga
Não comunicou a mudança da forma adequada, gerando estranhamento e revolta
Uma marca não é apenas um conjunto de formas ou fontes, mas um sistema complexo que comunica valores, histórias e expectativas. Em marcas tradicionais, especialmente aquelas que se valem de elementos icônicos para sua identificação e sentido, o design minimalista precisa ser aplicado com parcimônia e profundo respeito à memória afetiva do público.
O recuo da Cracker Barrel foi uma gestão de crise necessária, mas que deixa um alerta claro para o setor: rebrandings podem causar mais danos do que benefícios. A prática sustentável e estratégica de branding exige um processo detalhado de pesquisa, testes e validação com públicos-chave e, mais do que qualquer coisa: respeito aos dados e à metodologia.
Além disso, o movimento minimalista autêntico buscava enfatizar o essencial, mas hoje, muitas vezes, sofre descaracterização. O excesso de simplificação, mecanizado e produzido em massa, pode substituir o olhar atento do design original apenas pela busca do “menos é mais”, ignorando o contexto, a cultura e a função sensorial/emocional dos objetos e espaços.
Isso porque o design minimalista não é universalmente eficiente: determinados setores (moda, entretenimento, e-commerce) demandam impacto visual, riqueza subjetiva e criação de memórias, o que o minimalismo pode sufocar.
Conclusão para gestores
O desafio que fica para profissionais de branding é resistir a pressões por decisões baseadas puramente em visões pessoais ou tendência visual do momento e defender projetos alinhados genuinamente à essência das marcas: história, propósito, público.
Veja os cases completos incusos nesse artigo:
Conteúdo e Imagens por: Monique Lemos e Júlia Chaves


